Moradia popular

Justiça suspende votação de projeto que muda regras de áreas de moradia popular em Santos após ação da Defensoria Pública

Medida liminar barra andamento do PLC nº 27/2025, que altera dispositivo central da Lei de Uso e Ocupação do Solo 

Publicado em 15 de Dezembro de 2025 às 14:39 | Atualizado em 15 de Dezembro de 2025 às 14:39

A Justiça determinou a suspensão imediata da tramitação do Projeto de Lei Complementar (PLC) nº 27/2025 na Câmara Municipal de Santos. A decisão liminar foi proferida pela juíza Ariana Consani Brejão Degregório Gerônimo, da 3ª Vara da Fazenda Pública, em ação de tutela cautelar antecedente proposta pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo. 
 
O projeto altera a Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS) e mexe diretamente nas regras das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), áreas destinadas à implantação de programas habitacionais de interesse social. De acordo com o autor da ação, Defensor Público Felipe Pires Pereira, esse projeto tem o objetivo de privilegiar interesses privados em detrimento do interesse público, que é cumprir a lei na ZEIS 2-33 (Vila Mathias). 
 
Para o Defensor, há problemas de transparência e participação no processo legislativo: as emendas foram apresentadas poucos dias antes da votação em plenário, sem divulgação prévia no site da Câmara, e não houve novas audiências públicas para discutir essas alterações, apesar de elas mudarem substancialmente o conteúdo discutido com a população nas reuniões de setembro. A segunda votação do PLC chegou a ser pautada para menos de 24 horas após a primeira, em possível afronta ao Regimento Interno da Casa. "A participação popular efetiva é requisito de validade do processo administrativo e legislativo de alteração do uso e do zoneamento urbano. O art. 203 do Plano Diretor determina que todas as modificações sejam levadas ao conhecimento da população. O PL altera todo o Anexo II da Lei de ZEIS. Mas não é só em relação às ZEIS. O PL de revisão da LUOS restringe a circulação urbana alterando o Plano Municipal de Mobilidade, aumenta o uso retroportuário no bairro do Macuco, e o potencial construtivo nas Ruas Januário dos Santos, Rua Dom Lara, Rua Oswaldo Cochrane e Rua República do Peru, por exemplo, sem prévio debate público", afirma. 

Na ação, a Defensoria explica que o PLC nº 27/2025 recebeu 38 emendas na Câmara. Duas delas mudam de forma decisiva o artigo 152 da LUOS, justamente o dispositivo que trata da Outorga Onerosa de Alteração de Uso em áreas de ZEIS. Uma das emendas retira do projeto a revogação do art. 152, que havia sido aprovado pela sociedade civil na 13ª Conferência Municipal de Habitação, e a emenda aditiva dá nova redação ao artigo para deixar de exigir que a aprovação final dessas alterações em ZEIS seja feita por lei específica. Além disso, a nova redação permite aplicar as regras da zona em que o imóvel se encontra, desconsiderando os parâmetros especiais de Habitação de Interesse Social (HIS) e de Mercado de Habitação Popular (MHP) previstos no Plano Diretor e na Lei de ZEIS. 
 
Para o Defensor, essas mudanças afastam o controle mais rigoroso sobre o uso de áreas de ZEIS e prejudicam a política de moradia popular. Na Ação Civil Pública nº 1019990-49.2025.8.26.0562, já em curso na mesma Vara, a instituição lembra que a ZEIS-2-33, na região da Vila Mathias, exige que eventual empreendimento habitacional siga regras específicas: observância dos parâmetros próprios de ZEIS-2 e destinação de, no mínimo, 80% das unidades para Habitação de Interesse Social (HIS) e o restante para Habitação de Mercado Popular (HMP), conforme o Plano Diretor e a Lei de ZEIS. 
 
Ao conceder a liminar, a juíza destacou que, em análise inicial, há elementos suficientes para justificar a intervenção da Justiça, diante do risco de aprovação de um projeto com indícios de ilegalidade e de desvio de finalidade. Com isso, a decisão determina a imediata suspensão da tramitação do PLC nº 27/2025, incluindo a votação em sessão plenária que estava marcada para 10 de dezembro de 2025, até nova deliberação judicial. 
 
A medida busca garantir que qualquer mudança nas regras de uso do solo e nas áreas de ZEIS em Santos ocorra com transparência, respeito às normas urbanísticas e participação efetiva da população, especialmente das famílias de baixa renda que dependem da política habitacional de interesse social.