Direito Penal: Defensoria obtém decisão que reconhece ilegalidade de provas obtidas por incursão policial a domicílio sem prévia e fundada suspeita

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”

Publicado em 14 de Março de 2018 às 09:30 | Atualizado em 14 de Março de 2018 às 09:30

A Defensoria Pública de SP obteve uma decisão judicial que reconheceu a nulidade de provas obtidas por incursão policial a um domicílio, sob o argumento de existência de denúncia anônima, levando à absolvição de um homem de 23 anos acusado de tráfico de drogas.
 
O caso aconteceu em Taubaté (Vale do Paraíba) e contou com atuação do Defensor Público Leandro de Castro Gomes. Ele argumentou que os policiais, durante a ação, ofenderam a garantia da inviolabilidade de domicílio, prevista no artigo 5º, inciso XI, da Constituição, ao entrarem na residência do acusado apenas com base em suposta denúncia anônima.
 
Ainda de acordo com o Defensor, a casa não era abandonada, como argumentado pelos policiais, o que foi comprovado por meio de documentos de cobrança recebidos no local. Além disso, o portão estava fechado, já que ali eram mantidos animais domésticos, que poderiam fugir.
 
Em sua sentença, o Juiz Flavio de Oliveira Cesar, da 1ª Vara Criminal de Taubaté, citou decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário 603616/RO. Naquele julgamento, a Corte reconheceu repercussão geral da matéria e, por maioria de votos, firmou a tese de que “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados”.
 
Conforme voto do então relator, Ministro Gilmar Mendes, “provas ilícitas, informações de inteligência policial – denúncias anônimas, afirmações de ‘informantes policiais’ (pessoas ligadas ao crime que repassam informações aos policiais, mediante compromisso de não serem identificadas), por exemplo – e, em geral, elementos que não têm força probatória em juízo não servem para demonstrar a justa causa”.
 
O Juiz Flavio de Oliveira Cesar afirmou que vêm ocorrendo cada vez mais incursões policiais a casas, sem mandado judicial, anuência dos moradores ou motivos que os levem a presumir uma situação de flagrante. Assim, apontou que a expressão “fundadas razões” deve ser interpretada de forma mais restritiva, por se tratar de restrição à liberdade humana. “Seu alcance deve abarcar situações em que o policial verifica objetivamente indícios da existência de um crime sendo praticado no interior de residência habitada.”
 
O Magistrado ressalta que denúncia anônima não autorizaria nem sequer a instauração de inquérito policial ou expedição de mandado judicial de busca e apreensão, segundo a jurisprudência já assentou, assim como não autorizaria a entrada da Polícia na casa. “(...) se é verdade que o juiz deve se valer de indícios da mesma natureza para expedir uma ordem de busca domiciliar, e que essa ordem deve ser cumprida durante o dia, não parece razoável permitir que o agente de segurança pública excepcione a regra da inviolabilidade de domicílio sob pretexto que não seria válido para justificar a expedição de mandado judicial para tal finalidade, como é o caso, por exemplo, da denúncia anônima, e ainda o faça durante o repouso noturno dos moradores”, afirmou o Juiz na decisão.