Marília: Defensoria Pública de SP obtém decisão que altera nome de transexual que não realizou cirurgia para mudança de sexo

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”

Publicado em 11 de Julho de 2016 às 13:00 | Atualizado em 11 de Julho de 2016 às 13:00

João tem 44 anos e há anos vive um relacionamento estável com Carolina (nomes fictícios). Estaria tudo bem não fosse o fato de, por ter nascido com o sexo biológico feminino, todos seus documentos trazerem o nome de mulher. No entanto, todas suas características são masculinas, ele se porta como homem e é socialmente reconhecido como tal. A incompatibilidade entre seu documento e sua identidade sexual lhe causava sofrimento e humilhações, até a Defensoria Pública de SP obter, no dia 6/7, uma decisão que, mesmo sem realizar a cirurgia de transgenitalização, autorizou a alteração do nome e do sexo nos documentos de João.

A decisão foi obtida pela Defensora Pública Eloísa Maximiano Goto, de Marília. No pedido feito à Vara da Família e Sucessões da cidade, ela apontou que, apesar de ser convicto e tranquilo quanto a sua orientação sexual e sua identidade de gênero, de ter uma companheira que o aceita e o ama e de ser acolhido por sua família, “a manutenção do nome de mulher em seu registro e seus documentos traz, além do sofrimento causado pelo sentimento de inadequação de seu registro com sua intimidade, inúmeros constrangimentos no seu dia-a-dia”.

A Defensora afirmou, ainda, que tais constrangimentos violam fundamentos constitucionais básicos, como a dignidade da pessoa humana e o direito à saúde e à busca da felicidade. “Atualmente, não se deve pensar em saúde como a mera ausência de doença; a saúde deve ser compreendida da forma mais ampla possível, ultrapassando concepções de ordem meramente biológica (...). A saúde, como direito humano fundamental e complexo, abarca inúmeros aspectos da vida, é elemento estrutural da dignidade da pessoa. Nesse contexto, resta evidente que a manutenção de um prenome que não condiz com sua personalidade, nem com sua aparência e que lhe causa constrangimento, afronta seu bem-estar mental e social, ou seja, não lhe permite gozar de plena saúde”.

Em sua decisão, o Juiz José Antonio Bernardo, da 2ª Vara de Família e Sucessões de Marília, reconheceu que o nome, por ser a forma como o indivíduo se apresenta à sociedade, está vinculado ao exercício da cidadania. Considerou, ainda, as diversas situações vexatórias vividas por João. “O autor (João) se depara com situações vexatórias em convício público, pois a sociedade ainda não se adaptou ao convívio pacífico com as diferenças, talvez resquício de uma mentalidade obsoleta, que não acompanhou a evolução cultural e social vivenciada hodiernamente”. Dessa forma, determinou a alteração do nome e da designação do sexo dos registros civil de João.