Defensoria Pública obtém decisão judicial que reconhece nulidade de contrato habitacional que ameaçava moradia de idosa de baixa renda
Decisão judicial anula contrato que impunha lógica de mercado a moradora de habitação popular e reafirma a proteção da função social da política habitacional frente à financeirização do direito à moradia

Foto: Edson Lopes Jr/Secom/Divulgação
A pedido da Defensoria Pública de SP, uma importante decisão da 42ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo garantiu a proteção do direito à moradia de uma idosa de baixa renda, moradora de um conjunto habitacional na zona sul da capital paulista.
Dona Helena (nome fictício) celebrou em 1989 um contrato de compromisso de compra e venda com a Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo (COHAB) para aquisição de seu imóvel. Após anos de pagamentos, ela enfrentou dificuldades financeiras e ficou inadimplente.
Em 2010, foi chamada pela COHAB para negociar a dívida. No entanto, sem plena compreensão do que estava assinando, Dona Helena foi levada a firmar documentos que encerraram o contrato original e instituíram um novo contrato, agora com confissão de dívida e garantia de alienação fiduciária. A alienação fiduciária é um instrumento jurídico pelo qual o imóvel fica em nome do credor até a quitação total da dívida, permitindo que o bem seja levado a leilão em caso de inadimplência.
O novo contrato previa 300 parcelas e, após novo período de dificuldade financeira e impossibilidade de pagamento, o imóvel de Dona Helena ficou ameaçado de leilão. A Defensoria Pública do Estado de São Paulo ajuizou ação, alegando que a renegociação foi imposta sob lógica exclusivamente privatista, desconsiderando a função social da política habitacional e a situação de vulnerabilidade da moradora. Destacou-se que a operação visava mais assegurar créditos e interesses financeiros do que a efetivação do direito constitucional à moradia.
Na sentença, o juiz André Augusto Salvador Bezerra reconheceu que o caso não se tratava de uma relação privada comum, mas de uma política pública voltada à população vulnerável. “Há, como se vê, uma lógica completamente privatista na relação entre as rés e a autora, em que pese sua situação de vulnerabilidade a necessitar de política pública de habitação. Tudo foi feito sob a racionalidade de empresas privadas, sob a pura lógica de mercado”, apontou na decisão.
Assim, o magistrado declarou a nulidade do termo de confissão de dívida e do novo contrato firmado em 2010, vedando o leilão do imóvel e determinando a retomada do contrato original com a COHAB.
Para o Defensor Público Douglas Tadashi Magami, que foi responsável por levar o caso a Justiça, a importância desta decisão decorre do fato de, no âmbito da promoção de políticas públicas de moradia, garantir condições contratuais justas e adequadas à vulnerabilidade dos mutuários. “Isso porque a alienação fiduciária, em caso de inadimplemento, faz com que para evitar que os imóveis sejam leiloados, os mutuários tenham que pagar um montante muito alto a vista, o que é praticamente impossível”, afirmou.
A decisão reforça o papel da Defensoria Pública na proteção dos direitos de pessoas em situação de vulnerabilidade e na defesa da função social das políticas públicas, impedindo que interesses financeiros se sobreponham ao direito fundamental à moradia.