Defensoria obtém indenização por dano moral coletivo após manifestação racista do então Secretário-Adjunto de Turismo de Santos

“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.

Publicado em 28 de Fevereiro de 2020 às 15:00 | Atualizado em 28 de Fevereiro de 2020 às 15:00

A Defensoria Pública de SP obteve decisão favorável em uma ação civil pública que pedia à Justiça a condenação por danos morais coletivos de um ex-Secretário-Adjunto de Turismo de Santos, após virem a público manifestações racistas proferidas por ele. A decisão de primeira instância determina uma indenização no patamar de R$ 10 mil.

Um áudio compartilhado via WhatsApp e divulgado em veículos de imprensa e redes sociais na última semana revela uma declaração do então servidor Adilson Durante Filho; na gravação, o homem diz que pessoas de cor parda não têm caráter e não são confiáveis. Ele afirmou, ainda, que há estudos que comprovam a falta de caráter decorrente de miscigenação entre pessoas brancas e negras. Após a divulgação do áudio e consequente repercussão pública, ele foi exonerado da função na Prefeitura.

Em face das declarações, a Defensora Isadora Brandão Araujo da Silva e o Defensor Vinicius Conceição Silva Silva, Coordenadores do Núcleo Especializado de Defesa da Diversidade e da Igualdade Racial da Defensoria, propuseram ação civil pública com pedido de danos morais coletivos.

“A manifestação do réu é racista porque sustenta a falta de caráter, honestidade e lealdade, enfim, a inferioridade moral e psíquica inata à população parda, atribuindo-a ao fato de este grupo racial ser produto da miscigenação entre brancos e pretos”, sustentam na ação. “O discurso do réu dialoga com as doutrinas racistas e eugenistas vigentes no século XIX, que serviram de base para construção de uma ideologia que sustenta a superioridade racial branca e legitima o racismo”, apontam.

Indenização

A Defensoria pediu inicialmente que a Justiça condenasse o réu ao pagamento de indenização no valor de R$ 100 mil pelo dano moral coletivo decorrente de suas manifestações de caráter discriminatório à comunidade negra, a ser recolhida ao Fundo de Reparação de Interesses Difusos Lesados, previsto no artigo 13 da Lei n.º 7.347/85, e revertida para programas de combate ao racismo indicados pela Fundação Palmares.

Para embasar o pedido, Vinicius e Isadora citam a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, à qual o Brasil aderiu, e o Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010), que em seu art. 1º define a discriminação racial ou étnico-racial como “toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada”.

No pedido, a Defensoria argumenta que toda a comunidade negra foi ofendida em sua integralidade. “Injustificável permitir que, a pretexto de exercício da liberdade de expressão, sejam veiculadas manifestações que se traduzem em racismo e em incentivo à discriminação”, reforçam os proponentes da ação.

Na decisão, o Juiz José Wilson Gonçalves, da 5ª Vara Cível da comarca de Santos, deferiu o pedido da Defensoria e condenou o réu. “Posto que seja em grupo de WhatsApp, não se admite que alguém diga que os pardos brasileiros são todos maus-caracteres, que não tem um que não o seja, que todo pardo merece cuidado, que se trata de mistura de uma raça que não tem caráter, enfim, consoante transcrição constante da petição inicial e do parecer ministerial, e conteúdo do áudio-prova”, observou. Ele estipulou o pagamento em indenizações a título de danos morais em R$ 10 mil, acatando sugestão da Promotoria de Justiça. Cabe recurso da decisão.