Manifestação da Defensoria Pública de SP ao STF aponta dados de impacto da prisão automática em segunda instância na população carcerária
“Esta atuação faz parte do compromisso da Defensoria Pública de São Paulo enquanto instituição autônoma e comprometida com os valores do acesso à Justiça e dos Direitos Humanos”.
A possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, mesmo sem trânsito em julgado, deverá ser analisada pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal na próxima quinta-feira (17/10). Sobre o assunto, a Defensoria Pública de São Paulo enviou à Corte manifestações em que fornece dados a respeito do impacto dessas prisões sobre a população carcerária, sobretudo aos pobres.
A Defensoria Pública paulista atua na qualidade de amicus curiae nas ações declaratórias de constitucionalidade nº 43 e 44, que discutem a questão de modo amplo e abstrato em sede de controle de constitucionalidade.
Levantamento atualizado realizado pela Defensoria Paulista aponta que ao menos 30.076 mandados de prisão foram expedidos em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, de fevereiro de 2016 até outubro de 2019, com fundamento no Habeas Corpus nº 126.292, julgado pelo STF em 2016.
“A jurisprudência do STF produziu um impacto sobre toda a massa de casos julgados no País, que em sua esmagadora maioria envolve pessoas jovens, negras e sem escolaridade, não atingindo, portanto, em larga escala, pessoas acusadas de crimes referidos como de ‘colarinho branco’”, avaliam os Defensores.
A manifestação é assinada pelos Defensores Públicos Coordenadores do Núcleo Especializado de Situação Carcerária - Leonardo Biagioni de Lima, Thiago de Luna Cury e Mateus Oliveira Moro - e pelo Defensor Coordenador Auxiliar do Núcleo Especializado de Segunda Instância e Tribunais Superiores, Rafael Ramia Muneratti.
Segundo dados levantados pelo Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo até julho de 2019, somente São Paulo possuía 236.466 pessoas presas em suas 174 unidades prisionais – estado com maior número de pessoas processadas criminalmente, tanto que a Defensoria Pública de São Paulo, que atende pessoas pobres, é responsável por 1/5 do total dos habeas corpus impetrados no STJ e STF.
Dados da Defensoria Pública de São Paulo mostram, ainda, a importância do acesso a tribunais superiores para correção de decisões equivocadas de primeiro ou segundo grau: em 2018, foram recebidas 24.365 intimações de decisões. Tais intimações apontam média anual de 21,78% de decisões liminares concessivas de ordem em sede de habeas corpus impetrados somente pela DPSP no STJ. Em relação a decisões de mérito concessivas de ordem, tal percentual sobe para 61,84% em 2018, o que significa que aproximadamente 15.000 pessoas estavam cumprindo pena de maneira ilegal.
A manifestação aponta, ainda, que pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas, no projeto “Panaceia universal ou remédio constitucional? Habeas Corpus nos Tribunais Superiores” , que traz um recorte temporal entre 2008 e 2012, indicou que, dos habeas corpus impetrados pelas Defensoria Públicas de todo o pais, 66,4% tem a ordem concedida perante o STJ e 43,2% perante o STF, confirmando que a segunda instância não julga de acordo com os precedentes dos tribunais superiores e, portanto, “não há qualquer viabilidade de garantir, a partir dela, a segurança necessária para o início de cumprimento da pena”.
Diante dos números e considerando o enorme reflexo que a insegurança jurídica gerada pelas referidas mudanças acarretará para as pessoas mais carentes, a manifestação apresentada pela Defensoria Pública de São Paulo trilha no sentido de subsidiar o julgamento de pedido liminar, ou mesmo o julgamento do mérito das ações diretas de constitucionalidade nº 43 e 44.
A Defensoria tem divulgado, por exemplo, diversos casos de furtos frustrados de baixíssimo valor – desodorantes (https://goo.gl/CC5auz), peças de carne (https://goo.gl/6vhuUc) ou lenços umedecidos (https://goo.gl/ia7Ecf), entre outros – que são arquivados por insignificância penal apenas após recursos a tribunais superiores.